Nomes de Okinawa – Munchū e Yagō

Depois de apresentar o Uji (Clã), de que existe um sobrenome chinês, além de um símbolo no nome que identifica o clã e que o sobrenome atual era o topônimo de um título, imaginava que havia escrito tudo. (aqui)

Havia me esquecido do principal.
Convivo com pessoas que utilizam o yagō. Quando estive em Okinawa, foi necessário dizer o yagō para me apresentar aos parentes e aldeões da terra de meu pai. Parecia que só o nome e sobrenome não entendiam. Ao me apresentar como do yagō X, logo compreenderam quem eu era.
Outro termo é Munchū, que parece ter uma relação direta com o Yagō.
Yagō, Munchū… São termos que acabamos recuperando quando entramos em contato com a cultura ancestral.
Falo como se a cultura ancestral de Okinawa e a moderna fossem coisas bem distintas, mas isso tem a ver com a história da anexação de Okinawa ao Japão e a consequente assimilação da cultura japonesa que nossos ancestrais sofreram.
Mesmo no Japão, muita coisa mudou com a revolução Meiji.
No caso de Okinawa, fizeram algumas adaptações. Antes de falarmos do Yagō, veremos como era o que hoje temos como o sobrenome dos plebeus.

Sobrenome de um comum


Pouco se sabe a respeito de como surgiu ou como funcionava o que hoje temos como sobrenome dos comuns, até mesmo se era hereditário.

Vimos que os nomes da nobreza basicamente eram:

≪Sobrenome + nome (Chineses)≫ + ≪Topônimo + título + nome clânico≫ + ≪nome familiar
ex.: Ō Kishō (Wēng jìsōng) + Gusukuma Wēkata Seikyū + Taru-gani
 (翁 寄松 + 城間 親方 盛久 + 太郎金)
No caso dos plebeus, a ordem dos nomes parece ser mais parecido com o ocidental.

nome familiar + topônimo

ex.: Tarū Gusukuma (太郎 + 城間)


Esses sobrenomes passaram a ser fixos após a anexação ao Japão, com a implantação do sistema de registro civil japonês, conhecido como Koseki.

Quanto a origem de sobrenomes plebeus que na maioria também são topônimos, parece que utilizavam o nome de aldeias vizinhas. Há também sobrenomes que vieram de funções, cargos, além dos que adotaram o Yagō ou Yānnā como sobrenome.

A variedade de sobrenomes numa aldeia era muito pouca. Parece que era comum a existência de até 3 sobrenomes numa mesma aldeia e 6 sobrenomes quando muito.

É comum também numa mesma aldeia ter  yagōs iguais.

Definição de Yagō:

Yagō, mesmo significado que Yānnā

Yānnā

Segundo a Enciclopédia Okinawa, é o nome da casa, a identificação da moradia. Teve/tem importante função na identificação da família ou do indivíduo na aldeia ou comunidade.
Podemos dizer que existem 2 funções. Uma é a identificação da casa em relação à comunidade, e a outra a identificação da ramificação do clã.
Há 3 formas de nominação:

1. Da geografia, localização onde mora. (endereço)

ex.:
a. Chiji = topo, para casas em regiões altas da aldeia.
b. Mē = frente
c. Kushi = atrás
d. Agari = leste
e. Iri = oeste
f. Hama = praia 

Como afixos.

2. Da característica física, apelido, função ou profissão do dono da casa.

ex.:
a. Junsa-yā = casa do policial
b. Danpachi-yā = casa do barbeiro
c. Hagī-Gusukuma = Gusukuma careca

3. Do Uji, Munchū ou topônimo.

– É o tipo hereditário, passado ao filho mais velho. A nominação dos outros é feita de forma a possibilitar identificar a ramificação da família.

ex.:
a. Gusukuma-gwā (Pequeno Gusukuma)
b. Mī-Gusukuma (Novo Gusukuma)

Esta terceira forma parece ser a mais complexa, podendo misturar-se também com a primeira, identificando a linhagem e a localização da família na aldeia.

ex.:
Mī-Agari-Gusukuma (Novo Gusukuma do leste da aldeia)


Pelo que consta nos livros, parece que pode acontecer de se ter 2 Yagō. Um identificando a família em relação ao clã, e outro a casa em relação à comunidade da aldeia.
Para compreender muitas dessas palavras, que vão como prefixo e sufixo, é interessante se ter um dicionário de língua okinawana para melhor compreensão.

Munchū


Cada região, casta e Uji parecem ter suas características.

A grosso modo, Munchū se refere a organização que tem como base a linhagem masculina e que compartilha um ancestral comum com rituais realizados no túmulo desse ancestral, ou no túmulo coletivo do Munchū.

Teria funcionado também como uma espécie de seguro social do grupo.

É necessário considerar que a sociedade nos tempos de Ryukyu era organizada de forma que o primeiro filho varão herdava a casa dos pais. Assim, os outros filhos deveriam buscar uma nova casa.

Havia também casos de casais sem herdeiros. Seja por perda ou que não puderam ter um filho.

Buscando o bem comum dos membros do Munchū, os outros filhos eram adotados por esses casais sem herdeiros. Assim, tinha-se pessoas próximas, ligados pelo sangue do pai, cuidando uns aos outros.

Gostaria muito de dizer que um Uji é o mesmo que um Munchū, mas isso não parece ser regra geral. Há casos de Uji que se dividiram em vários Munchū. Sem esquecer também dos plebeus, que não possuem Uji.

E Munchū de nobreza possui um Uji. Também deve haver em algum lugar a árvore genealógica do Uji, que era o documento de registro da época de Ryukyu.

O documento original era em formato de livro, com a árvore e o currículo dos chefes de cada geração.

Talvez seja interessante perguntar sobre a história da família para os mais velhos. Quem sabe tenham novas descobertas.


Nomes de Okinawa – Nome Chinês e Nanorigashira

Nomes de Okinawa – Nome Chinês e Nanorigashira

Artigo com adaptações em alguns termos.
Quem não tem um parente ou um amigo okinawano do qual todos os membros de sua família, ou a sua maioria, compartilham um mesmo som no nome japonês? As vezes até mesmo o nome brasileiro.
Seria um kanji (ideograma chinês) compartilhado, para ser mais exato.
Talvez sejam poucos ao redor de algumas pessoas, ou ainda não conheceram alguém assim. Mas é um costume bastante comum. Ou pelo menos era.
Lembro-me que minha prima um dia me perguntou de alguns kanjis que queria combinar com a da família de seu marido. Parece que o sogro fez questão que usassem o kanji.
Na minha família também, utilizamos um mesmo kanji, compartilhado por quase todos os membros masculinos.
Akihide
Alguns já devem ter percebido que esse kanji, do começo do nome, serve para identificar as pessoas da mesma família e todo o clã.
Parece estranho, pois se pensarmos que o sobrenome já é suficiente para identificarmos nossos parentes, qual a necessidade de se usar um símbolo, no caso o kanji, a mais?

Topônimo associado ao título de nobreza


Pois bem, o que usamos hoje como sobrenome é insuficiente para identificarmos nossos parentes.
O que muitos okinawanos hoje utilizam como sobrenome, são na sua origem topônimos dos títulos nobiliárquicos da época do Reino de Ryukyu, que mudava conforme era promovido na corte.
Ao que parece, um indivíduo poderia mudar de sobrenome, no caso topônimo, durante a vida, quantas vezes fosse promovido e recebesse um novo título e sobrenome.
No início da carreira, o indivíduo herdaria o sobrenome do pai, Higa por exemplo, mas se fosse promovido, poderia receber novos sobrenomes como Makishi, Nagata etc. Caso não servisse a corte, ou não fosse promovido, continuaria com o mesmo sobrenome do pai.
Topônimo, segundo o dicionário priberam, é nome próprio de lugar, sítio ou povoação.

Sobrenome chinês

Assim, para identificar a que família um indivíduo pertence, passam a utilizar o sobrenome chinês. Conhecido como uji (), que pode ser entendido como o nome do clã.
E surge uma questão. Por que um sobrenome chinês?
Para entendermos isso, devemos considerar a história de Ryukyu, que mantinha estreitas relações, tanto comerciais como diplomáticas, com a China.
Além do fato de que parte da nobreza ia estudar na China.
E para facilitar as coisas, adotavam nomes chineses. De início, adaptavam seus nomes para a leitura chinesa, mas logo passaram a utilizar um sobrenome chinês compartilhado pelo clã.
E o cartório de registros do Reino de Ryukyu utiliza justamente o sobrenome chinês para identificar os clãs. Já que havia inúmeros sobrenomes diferentes num mesmo clã.
Diga se de passagem, quem não tinha registro nesse cartório era considerado um comum.

Mais um nome de registro

Além do topônimo associado ao título de nobreza, o nome e o sobrenome chinês, os antigos okinawanos possuíam um nome clânico. E é justamente esse nome que continuaram utilizando mesmo depois da anexação ao Japão.
Basicamente, esse nome clânico é composto por dois kanjis. Sendo o primeiro kanji compartilhado pelos membros do mesmo clã.
Essa tradição ainda está presente em algumas famílias. Há casos em que por algum acidente de percurso, a pessoa foi registrada com um kanji diferente. Conheci um senhor que dizia que registraram seu kanji errado, já que o clã usa outro.

O identificador do nome clânico

Esse nome clânico é chamado de Nanori (名乗) e o identificador, o primeiro kanji, de Nanorigashira (名乗頭).
As vezes, só o identificador (nanorigashira) é suficiente para identificar a que clã (uji) o indivíduo pertence. Um exemplo seria o identificador das ramificações da família real, que é .
é comumente lido como Cho e Tomo, mas talvez é possível encontrar outras leituras. O importante é o kanji, já que há outros com a mesma leitura Cho como , que pertence a um outro clã.
Como pode perceber, não estou dando tanta importância para o significado do kanji neste momento. Apenas tenha em mente que este nanorigashira é uma forma de identificar a família.
Abaixo, 2 descendentes da realeza.
Chobyo Yara (屋良) – Primeiro Governador eleito por voto popular de Okinawa.
Choki Motobu (本部) – Fundador do estilo Motobu de caratê.

O nome familiar

Hoje talvez não seja comum, mas até a geração do meu avô, costumava-se ter o que chamam de Warabina ou Duna (童名).
No início, parece que não existia sobrenome. Apenas esse nome, e um título, se tivesse. Depois surgiu a necessidade de um nome para se relacionar com a China, depois outro com o Japão. Que se tornaram os nomes oficiais.
No ambiente familiar ou entre amigos, se utilizava o warabina.

Excessões

A nobreza da Chinatown de Okinawa possui estrutura semelhante, mas não utilizam, ou não utilizavam, o nanorigashira. Seguem uma regra chinesa para dar o nome.
Quanto ao meu nanorigashira, não vem da tradição dessa nobreza. Minha família é comum. O uso do kanji  na minha família começou com o meu tio avô, que foi instrutor na escola da marinha japonesa em Okinawa. Em sua homenagem, adotaram o primeiro kanji de seu nome como nanorigashira, desejando que as gerações futuras fossem como ele.
Ao que parece, uma parcela dos comuns foi registrada no registro japonês com parte do nome da aldeia utilizada como nanorigashira. Seria o caso dos homens oriundos da mesma aldeia tendo parte de seu nome escrito da mesma forma que o nome da aldeia.