Artigo com adaptações em alguns termos.
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Quem não tem um parente ou um amigo okinawano do qual todos os membros de sua família, ou a sua maioria, compartilham um mesmo som no nome japonês? As vezes até mesmo o nome brasileiro.
Seria um kanji (ideograma chinês) compartilhado, para ser mais exato.
Talvez sejam poucos ao redor de algumas pessoas, ou ainda não conheceram alguém assim. Mas é um costume bastante comum. Ou pelo menos era.
Lembro-me que minha prima um dia me perguntou de alguns kanjis que queria combinar com a da família de seu marido. Parece que o sogro fez questão que usassem o kanji.
Na minha família também, utilizamos um mesmo kanji, compartilhado por quase todos os membros masculinos.
Akihide
明秀
明〇
Alguns já devem ter percebido que esse kanji, do começo do nome, serve para identificar as pessoas da mesma família e todo o clã.
Parece estranho, pois se pensarmos que o sobrenome já é suficiente para identificarmos nossos parentes, qual a necessidade de se usar um símbolo, no caso o kanji, a mais?
Topônimo associado ao título de nobreza
Pois bem, o que usamos hoje como sobrenome é insuficiente para identificarmos nossos parentes.
O que muitos okinawanos hoje utilizam como sobrenome, são na sua origem topônimos dos títulos nobiliárquicos da época do Reino de Ryukyu, que mudava conforme era promovido na corte.
Ao que parece, um indivíduo poderia mudar de sobrenome, no caso topônimo, durante a vida, quantas vezes fosse promovido e recebesse um novo título e sobrenome.
No início da carreira, o indivíduo herdaria o sobrenome do pai, Higa por exemplo, mas se fosse promovido, poderia receber novos sobrenomes como Makishi, Nagata etc. Caso não servisse a corte, ou não fosse promovido, continuaria com o mesmo sobrenome do pai.
Topônimo, segundo o dicionário priberam, é nome próprio de lugar, sítio ou povoação.
Sobrenome chinês
Assim, para identificar a que família um indivíduo pertence, passam a utilizar o sobrenome chinês. Conhecido como uji (氏), que pode ser entendido como o nome do clã.
E surge uma questão. Por que um sobrenome chinês?
Para entendermos isso, devemos considerar a história de Ryukyu, que mantinha estreitas relações, tanto comerciais como diplomáticas, com a China.
Além do fato de que parte da nobreza ia estudar na China.
E para facilitar as coisas, adotavam nomes chineses. De início, adaptavam seus nomes para a leitura chinesa, mas logo passaram a utilizar um sobrenome chinês compartilhado pelo clã.
E o cartório de registros do Reino de Ryukyu utiliza justamente o sobrenome chinês para identificar os clãs. Já que havia inúmeros sobrenomes diferentes num mesmo clã.
Diga se de passagem, quem não tinha registro nesse cartório era considerado um comum.
Mais um nome de registro
Além do topônimo associado ao título de nobreza, o nome e o sobrenome chinês, os antigos okinawanos possuíam um nome clânico. E é justamente esse nome que continuaram utilizando mesmo depois da anexação ao Japão.
Basicamente, esse nome clânico é composto por dois kanjis. Sendo o primeiro kanji compartilhado pelos membros do mesmo clã.
Essa tradição ainda está presente em algumas famílias. Há casos em que por algum acidente de percurso, a pessoa foi registrada com um kanji diferente. Conheci um senhor que dizia que registraram seu kanji errado, já que o clã usa outro.
O identificador do nome clânico
Esse nome clânico é chamado de Nanori (名乗) e o identificador, o primeiro kanji, de Nanorigashira (名乗頭).
As vezes, só o identificador (nanorigashira) é suficiente para identificar a que clã (uji) o indivíduo pertence. Um exemplo seria o identificador das ramificações da família real, que é 朝.
朝 é comumente lido como Cho e Tomo, mas talvez é possível encontrar outras leituras. O importante é o kanji, já que há outros com a mesma leitura Cho como 長, que pertence a um outro clã.
Como pode perceber, não estou dando tanta importância para o significado do kanji neste momento. Apenas tenha em mente que este nanorigashira é uma forma de identificar a família.
Abaixo, 2 descendentes da realeza.
Chobyo Yara (屋良朝苗) – Primeiro Governador eleito por voto popular de Okinawa.
Choki Motobu (本部朝基) – Fundador do estilo Motobu de caratê.
O nome familiar
Hoje talvez não seja comum, mas até a geração do meu avô, costumava-se ter o que chamam de Warabina ou Duna (童名).
No início, parece que não existia sobrenome. Apenas esse nome, e um título, se tivesse. Depois surgiu a necessidade de um nome para se relacionar com a China, depois outro com o Japão. Que se tornaram os nomes oficiais.
No ambiente familiar ou entre amigos, se utilizava o warabina.
Excessões
A nobreza da Chinatown de Okinawa possui estrutura semelhante, mas não utilizam, ou não utilizavam, o nanorigashira. Seguem uma regra chinesa para dar o nome.
Quanto ao meu nanorigashira, não vem da tradição dessa nobreza. Minha família é comum. O uso do kanji 明 na minha família começou com o meu tio avô, que foi instrutor na escola da marinha japonesa em Okinawa. Em sua homenagem, adotaram o primeiro kanji de seu nome como nanorigashira, desejando que as gerações futuras fossem como ele.
Ao que parece, uma parcela dos comuns foi registrada no registro japonês com parte do nome da aldeia utilizada como nanorigashira. Seria o caso dos homens oriundos da mesma aldeia tendo parte de seu nome escrito da mesma forma que o nome da aldeia.